16.10.09

Faculdade pública: por que não é paga?

José Walter Toledo Silva
 
Segundo a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio do IBGE, o Brasil tinha, em 2008, 6,25 milhões de estudantes em cursos superiores. Destes, 4,77 milhões estudavam em escolas particulares e 1,48 milhão em faculdades da rede pública.

É enorme o custo das faculdades públicas gratuitas para quase 1,5 milhão de alunos que usufruem, sem pagar, do benefício da educação superior que contribuirá decisivamente para formar os integrantes da elite econômica no futuro.

(Nesse sentido,dados da
Síntese de Indicadores Sociais divulgados em 28/09/2007 por Eduardo Nunes, presidente do IBGE,indicam que mais da metade dos alunos que freqüentam as universidades públicas brasileiras faz parte da faixa que compreende os 20% mais ricos da população).

Essa conta da faculdade gratuita, paga pelo Estado, significa, em última análise, que o pagamento é feito não pelos que usufruem ou usufruirão do benefício do curso superior, mas por aqueles que não podem cursar a faculdade, por precisar começar a trabalhar mais cedo ou por quaisquer outras limitações de ordem sócio-cultural ou psicológica.

Essa injustiça é particularmente gritante no Brasil, onde a distribuição de renda continua sendo uma das piores do mundo e onde se apresenta significativa correlação entre renda e nível educacional.

De forma nenhuma sugere-se que seja restringido o acesso à educação superior para quem não pode pagar.

Mas,nas condições abaixo sugeridas,por que não poderiam os próprios alunos beneficiados pagar a conta?

Se dispõem da renda para tanto (como é o caso de muitos) não há porque não pagar o custo de seus estudos durante o curso.

Para os que não dispõem de renda pessoal ou familiar suficiente, por que não conceder um empréstimo, para começar a ser pago após o curso em, digamos, 30 anos ou mais, a juros baixos, com parcelas e prazos revistos em função de renda futura?

Afinal, há empréstimos por 30 anos ou mais a juros baixos para compra de imóveis de baixo preço, além de outros tipos de crédito concedidos ao setor agro-pecuário, à indústria, ao comércio, incluindo “socorros” a diversos setores da economia em dificuldades devido à crise.

Se os alunos das faculdades públicas pagarem pelo benefício que auferem na forma sugerida, os vultosos recursos públicos atualmente destinados a manter as faculdades públicas gratuitas possibilitariam talvez:

a)Investimentos para ampliar a disponibilidade e melhorar a qualidade de ensino fundamental,médio e profissionalizante; (veja dados ao final deste artigo)

b) pesquisas e outros esforços para a melhoria da qualidade de ensino superior, inclusive para proporcionar maior empregabilidade aos formandos;

c) investimentos para aumento de número de vagas no próprio ensino superior e para atender a demanda de candidatos que preencham os requisitos mínimos estabelecidos;

d) maior geração de empregos para ampliação de vagas e melhoria de qualidade de ensino em todos os níveis.

Desde a Constituição do Brasil de 5 de outubro de 1988, com 21 anos de vigência, tivemos 5 presidentes da República e 5 legislaturas.

Nesse período, nossa Carta Magna teve mais de 50 modificações através de Emendas, mas nenhuma delas tocou no dispositivo que estabelece o ensino superior público gratuito.

Empecilhos legais atuais para reverter a injustiça de estudantes de faculdades, mesmo os ricos, não pagarem pelos seus estudos, devem ser removidos.

Há inúmeros exemplos de mudanças na legislação para ajustes a necessidades sociais em transformação. Um exemplo: até 1927, mulheres não podiam votar no Brasil, conforme a legislação vigente, que foi modificada para corrigir a distorção.

Pagamento da faculdade através de crédito a longo prazo e a juros baixos, conforme a renda, contribuiria para a observância do princípio constitucional de isonomia. É mais fácil aferir-se renda individual e familiar do que raça e cor, que também não devem ser objeto de discriminação.

ALGUNS FATOS SOBRE EDUCAÇÃO NO BRASIL
(extraídos de estatísticas do IBGE) 



  • De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2007 o Brasil tem 2,4 milhões de analfabetos com idade entre 7 e 14 anos, dos quais 2,1 milhões (87,2%) freqüentavam a escola no ano anterior.
  • Do total de 1,3 milhão de pessoas de 8 a 14 anos que não sabem ler e escrever, a grande maioria (84,5%) está matriculada em alguma turma de ensino fundamental ou médio, mas um contingente de 1,1 milhão de crianças e adolescentes que estão nas salas de aula ainda são consideradas analfabetas.
  • Metade dos brasileiros acima dos 25 anos não completou o ensino fundamental.
  • Dos cerca de oito milhões de brasileiros que passaram por Educação de Jovens e Alunos (EJA), o antigo supletivo, antes de 2007, 42,7% não concluíram o curso. O principal motivo apontado foi a incompatibilidade do horário das aulas com o de trabalho ou de busca por emprego (27,9%).
  • Apenas 36,8% dos jovens de 18 a 24 anos têm tempo de estudo correspondente ao ensino médio completo (conforme a Síntese dos Indicadores Sociais de 2008)


3 comentários:

  1. Legal, Zé. Uma iniciativa de discussão com bases informadas e inteligentes. Parabéns.
    Como não poderia deixar de fazer, respondo à sua "provocação".
    Concordo com sua sugestão de financiar os estudos para quem não pode pagar, mas que a escola seja paga.
    Creio que o grande problema para se corrigir essa e outras mazelas da sociedade brasileira (principalmente, mas não só ela) é a convicção dos governantes que os governados são seres inferiores, destituídos de inteligência e discernimento e que devem ser manejados como gado, "para seu próprio bem".
    No dia em que o governo entender que seu papel não é de ser pai, mas de cuidar das coisas de cunho geral, talvez possamos ter indivíduos cônscios de suas responsabilidades, animados para o progresso pessoal e aptos a defender seus direitos e a cumprir suas obrigações.
    "Dar" oportunidade de educação superior aos "menos favorecidos" ignora que essa educação tornará os indivíduos em favorecidos, capazes de retribuir o "benefício" recebido. A melhor maneira de assegurar que somente os bem-intencionados, capazes e merecedores recebem o "benefício" é que eles o devolvam assim que começarem a usufruí-lo.
    No entanto, como de costume, as coisas não são feitas para funcionar, mas por outros (e algumas vezes, inconfessáveis) motivações.
    Abraços,
    JC

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  2. José Walter,
    Gostei muito do seu blog.
    Quanto à postage, as idéias apresentadas são excelentes. O difícil vai ser convencer o pessoal do Governo a mudar as coisas, pois a falta de cultura e educação garante a eles a permanência do estado de coisas que temos atualmente. Um Brasil com o povo educado e politizado não estaria passando pelo que estamos vendo, pois a população saberia cobrar e exigir. Por enquanto, só a "Bolsa Esmola" já garante os votos e... tudo bem, não é mesmo?
    Abçs.

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  3. Obrigado pelo estímulo, grandes amigos de longa data, Zé Carlos e Berenice. José Walter.

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